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"Mudanças
climáticas contribuíram para guerra na Síria"
Estudo aponta que agravamento das secas e
deslocamento da população estão ligados à eclosão do conflito. Regime Assad só
estava preocupado com situação econômica no curto prazo, afirma pesquisador em
entrevista à DW.
Um estudo recente publicado na revista científica
americana Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS) aponta
que as mudanças climáticas globais foram um dos fatores que contribuíram para
fazer eclodir a guerra civil na Síria, em 2011.
O principal autor da pesquisa é Colin Kelley,
pós-doutorando do Departamento de Geografia da Universidade de Santa Barbara,
na Califórnia. Em entrevista à DW, ele afirma que entre os elementos centrais
de conexão entre o clima e o conflito sírio estiveram o agravamento das secas
causado pelo aquecimento global, a destruição das colheitas e o consequente
deslocamento da população.
DW: A guerra civil na Síria começou há mais de
quatro anos, em março de 2011. O que o senhor quer dizer quando afirma que as
mudanças climáticas contribuíram para o conflito?
Colin Kelley: Há uma clara sequência de eventos [climáticos]
antes da insurreição, por exemplo: uma tendência ascendente na temperatura ao
longo dos últimos 85 a 100 anos. Nos últimos 25 anos, houve três secas. A
última, pouco antes do início do conflito, durou entre três e quatro anos e foi
a mais severa já registrada. Então, nos perguntamos: quão severas essas secas
teriam sido sem a tendência ascendente da temperatura, que presumimos ser
induzida pelo homem? E descobrimos que haveria uma grande diferença no grau de
severidade. Portanto, isso apontou as mudanças climáticas como um fator que
contribuiu para a seca.
Qual foi o impacto da seca?
Ela foi tão severa que basicamente causou o colapso
da agricultura na região nordeste [da Síria], cujos habitantes dependiam muito
da produção de trigo. Com a seca e a perda da safra, muitos fazendeiros
deixaram suas localidades, e começou uma migração em massa para as cidades.
Isso foi logo depois de os Estados Unidos terem começado a intervenção militar
no Iraque. Então, combinando isso com o crescimento natural da população, houve
um tremendo choque demográfico nas cidades do oeste da Síria.
O acréscimo populacional chegou a 50% entre 2002 e
2010, e os recursos simplesmente não bastaram para lidar com ele. O governo [do
presidente sírio Bashar al-] Assad também fez muito pouco para apoiar essa
população. Portanto, todos esses fatores se encontraram e empurraram [os
sírios] para além do limite de resistência deles.
É possível quantificar cientificamente a alta da
temperatura e o crescimento demográfico. Mas pode-se medir o papel das mudanças
climáticas, em relação a outros fatores como a falta de liberdade de expressão,
a Primavera Árabe nos outros países, e assim por diante?
É muito difícil, talvez impossível, quantificar
cada um dos efeitos que confluíram para causar a revolta. Também havia muito
pouca informação disponível sobre quantas pessoas seguiram para qual cidade.
Porque essa informação igualmente era guardada a sete chaves pelo governo sírio
e porque a situação era simplesmente muito caótica.
Mas temos informações bastante confiáveis sobre as
estimativas populacionais do crescimento total. Se você tem esse crescimento e
não dispõe de recursos suficientes para lidar com ele, não é difícil imaginar
como isso pode contribuir para a revolta que ocorreu. As mudanças climáticas
agiram como um potencializador da ameaça.
Seca de 2009 também devastou o vizinho Iraque
O que se poderia ter feito para prevenir o
conflito, nesse contexto?
Na nossa publicação, mencionamos que um grande
número de fatores contribuiu para o nível de vulnerabilidade da Síria. Por
exemplo, o país dava uma grande ênfase á produção de trigo, que perfazia 25% do
Produto Interno Bruto (PIB). Depois da seca, esse número despencou, e quase do
dia para a noite a Síria passou de exportadora líquida a importadora líquida de
trigo.
A safra de trigo depende fortemente das chuvas de
ano para ano, mas também no nível do lençol freático. E este se esgotou bem
para além dos limites da sustentabilidade. Mas o regime Assad não estava
preocupado com o que pudesse acontecer no futuro, mas só em melhorar a própria
posição econômica no curto prazo.
Como as mudanças climáticas afetam a atual situação
da Síria, e que papel desempenharão no futuro?
Os modelos climáticos sugerem que essa região vai
continuar a ficar mais seca ao longo do século 21 – e isso certamente é
alarmante. Mesmo que o conflito chegasse logo ao fim, isso representará um
problema real para os agricultores, por exemplo, que estão tentando compor uma
base de subsistência sustentável.
Que passos deverão ser tomados?
É preciso que se pense mais no longo prazo, que
haja um foco real sobre os tipos de eventos passíveis de ocorrer com
frequência, no futuro. Tem havido uma carência disso, e não só na Síria. Os
políticos só cumprem um mandato curto, eles não atuam por 50 ou 100 anos. Por
isso, se dá muita ênfase ao futuro próximo, e muito menos ao de longo prazo.
Acho que esse tipo de questão [de longo prazo] está realmente ficando cada vez
mais importante.
Fonte:. Acesso: 26/12/2016.
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